quarta-feira, 6 de junho de 2007

Carta Estadão I

São Paulo, 06 de junho de 2007
Ilmo sr. Sergio Pompeu
EDITOR CHEFE DO CADERNO CIDADES

C/C para o jornalista Alexssander Soares

Prezado Editor Chefe



Em respeito à matéria publicada no Caderno Cidades, C5, em 3-6-07, o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, ONG que congrega entidades ambientalistas e de proteção animal da maioria de municípios e Estados brasileiros com representação no setor, tem, entre suas afiliadas, três entidades mencionadas na matéria, como aquelas conveniadas com a Prefeitura. Mais ainda, tem a honra de contar, na sua Diretoria, com a sra. Ângela Caruso, como participante da questão levantada. Urge, portanto, que o Fórum se manifeste.

São Paulo, como todos sabem, é uma cidade atípica em vários aspectos, um deles , a sua densidade populacional e o elevado crescimento urbano. Caminhamos para doze milhões de habitantes. Decorrentemente, a relação entre os seres humanos com as demais espécies torna-se cada vez mais complicada. No que se refere a cães e gatos, acredita-se que haja um cão para cada sete pessoas (nos bairros mais densos, a proporção chega a 1:5). Quanto aos felinos, acredita-se que seja de 1:16.. Segundo estimativas, 6% dessa população canina e felina se encontra em abandono. Pode-se dizer que no município de São Paulo existem cerca de 95 mil cães em abandono (quanto aos gatos as estimativas são mais difíceis).

Animais errantes sofrem, nas ruas, toda a espécie de crueldade e carências. Sofrem e causam acidentes, apanham e transmitem doenças. Além de um problema ético, pois são vidas que merecem ser respeitadas, são um problema de saúde pública.

Por longos anos, o que se fez foi captura e matança desses animais. Captura e matança, nada mais. Como os animais se reproduzem, produzindo ninhadas numerosas, o controle reprodutivo constituía apenas no extermínio, não se cogitava a hipótese da adoção de medidas preventivas como educação da população para a posse responsável, controle de natalidade e campanhas de adoção. O processo adotado, além de antiético e cruel (matavam-se cerca de 300 animais por dia nas câmaras de descompressão do CCZ), era oneroso para os cofres públicos (usavam-se as

“carrocinhas”, veículos antipáticos à população, que capturavam traumaticamente os animais de rua), os quais davam gasto com combustível e alimentação, e com os numerosos funcionários necessários à operação, que percorriam as ruas.

Pois bem: há pouco mais de duas décadas, depois de longo e difícil trabalho de um grupo de ambientalistas e defensores dos animais, mudanças importantes foram
alcançadas. Foi um trabalho de muita dimensão. Conseguir o convencimento de autoridades, implantar princípios preconizados pela OMS, mudar o sistema. Fazer com que a Constituição Federal e toda a legislação pertinente aos animais fosse cumprida. Confrontar posicionamentos hostis. Provar racionalmente que os cuidados de bem-estar animal eram de interesse de saúde pública e que, além de tudo, seria mais econômico quanto aos gastos exigidos.

O CCZ de São Paulo passou a trabalhar em parceria com as entidades de proteção. Programas educativos passaram a ser desenvolvidos, o manejo e morte dos animais foi modificado.Em 2000 foram retiradas as câmaras de descompressão do CCZ (que na realidade matavam por asfixia, dando morte agônica aos animais), enquanto que o Fórum entrou com ação cível pública exigindo tratamento não cruel aos animais do CCZ). No ano de 2001.foi publicada a lei municipal 13131 de posse responsável, induzindo o RGA (registro dos animais), a vacinação e outras determinações positivas. Nesse mesmo ano foi criado o “Programa Saúde Animal”. A Prefeitura aceitou abrir convênios com as ONGs, que passaram a trabalhar em parceria. A Prefeitura oferecia parte dos subsídios(ficha de cadastro, formulário, plaqueta,coleira, vacina anti-rábica, seringas...), enquanto as entidades compareciam com o trabalho veterinário, trabalho de voluntários,alimentação dos voluntários, material de assepsia... entrava com as cirurgias, ou seja, os procedimentos. Tudo para populações carentes, de periferia, tudo gratuitamente para os munícipes.

Em seis anos de trabalho, 141 mil animais foram castrados. Muitos milhares de animais deixaram de nascer. Foi um trabalho social, ético e de saúde pública, de imensa envergadura. Importante foi a contribuição pública de São Paulo. Muitos e muitos outros municípios animaram-se com o exemplo de São Paulo, outros Estados também e até mesmo, em nível federa, encontra-se tramitando no Congresso Projeto de Lei para conseguir no país procedimentos semelhantes.

Eis que fomos surpreendidos, no domingo último, com matéria infundada, descuidada, resultante de má fé ou ingenuidade de alguém e incompatível com a seriedade, o conceito , o porte de O ESTADO DE SÃO PAULO. A s entidades atingidas, inquestionavelmente, se isentarão de culpa. Entretanto, os malefícios causados são irreversíveis. Quando se aponta para a conduta de alguém, sempre sobrarão respingos, dúvidas por pessoas que não se aprofundam na questão...



A desonra atingiu a todos, pessoas que lutam bravamente pelos excluídos, motivadas apenas pelo dever moral de proteger o mais fraco, suprir as necessidades especiais, beneficiar a sociedade.

O mal está feito. Anos de toda essa luta poderão ir abaixo, pois o que as autoridades renitentes mais necessitavam para impedir o programa, a matéria publicada forneceu.. Daqui por diante, será muito mais difícil caminhar. Lamentavelmente!.


Sônia Fonseca
Presidente
RG 2 100 823 SSP SP


PS. Para que se tenha alcance do que o jornalista conseguiu com a matéria, gostaria de citar um exemplo prático. Há alguns anos, uma escola infantil foi caluniada. Crianças estariam sofrendo abuso sexual. Tudo foi esclarecido, a Escola saiu incólume. Entretanto, faço uma pergunta; o senhor colocaria o seu filho nessa escola?